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21/06/2012
Aquecimento global e pecuária: o que todo pecuarista deve saber sobre ele


Poucos assuntos irritam tanto o pecuarista como o envolvimento do boi no aquecimento global. Seu maior desejo seria alguém confirmar que o aquecimento global (AG) é a balela científica do século ou que o boi não tem nada a ver com isso. Iniciaremos esse texto colocando esses assuntos em perspectiva.

Quanto ao AG, ele tem sido estudado no mundo inteiro intensamente há algumas décadas e a maioria dos climatologistas acredita que há evidências suficientes de sua ocorrência e que ele tem relação com o aumento da concentração de carbono (C) na atmosfera causada por atividades humanas. Por ser uma ciência muito complexa e ainda cheia de incertezas, é impossível gerar apenas um cenário futuro, havendo a geração de inúmeras possibilidades. Aqui começam os problemas, pois para quem estiver interessado em criar terror com o assunto, basta selecionar os cenários catastrofistas. De maneira inversa, a quem interessar menosprezá-lo, muitas vezes apenas para ter seus 15 minutos de fama, basta escolher cenários que mostrem pouco ou nenhum efeito. De fato, um dos cenários possíveis nas modelagens do AG, por mais inusitado que pareça, é o esfriamento do planeta! O fato é que esses cenários extremos são os menos prováveis de ocorrerem, o que denota a desinformação ou desonestidade de quem os avoca como cenários prováveis.

Ocorre que, mesmo para os cenários intermediários, pode-se esperar efeitos significativos no clima e, consequentemente, na nossa vida. Os dados climáticos mais recentes tem corroborado a ocorrência do AG. Caso eles se confirmem daqui uns 30 ou 50 anos, não teremos como voltar atrás e apenas sobrará o arrependimento de não termos começado a mitigar o problema desde hoje, como a grande maioria dos cientistas tenta nos convencer.

Já o envolvimento da pecuária no problema está relacionado principalmente ao fato do ruminante, em sua parceria com os microrganismos que habitam seu rúmen e que lhe permite aproveitar materiais fibrosos, produzir metano, gás 25 vezes mais potente que o gás carbônico na retenção do calor. Admite-se hoje, somado aos demais gases de efeito estufa (GEE) como o óxido nitroso proveniente da degradação das excretas, que de 10 a 18% dos GEE gerados pelas atividades humanas são de origem de animais ruminantes.

Portanto, infelizmente, nem o AG é uma farsa, nem o boi não tem nada a ver com ele. Junto com essa verdadeira provação ao produtor de carne decorre outra ainda maior que é o sensacionalismo como o tema é tratado. Mês passado, por exemplo, foi divulgado um trabalho de pesquisadores europeus em que foi apresentado com a seguinte manchete "Produzir 1 kg de carne no Brasil equivale a rodar 1,6 mil km de carro". A primeira coisa que chama a atenção é que esse dado da reportagem não consta do artigo científico, mostrando já predisposição em macular a imagem do setor. Com relação ao conteúdo do trabalho propriamente dito, apesar da seriedade com que foi feito, ele adota uma abordagem francamente oposta à produção de carne, como se houvesse grande vantagem em reduzir seu consumo e sua produção.

Por conta dessa abordagem, os autores sugerem incluir na "conta" da pecuária o que eles chamaram de "dreno de C potencial perdido", considerando o C da vegetação natural que retornaria a área em que se produz carne, caso ela fosse vedada. A justificativa, segundo os autores, seria que há pressa em reduzir a concentração de C na atmosfera e que isso daria uma ideia melhor aos consumidores em suas escolhas. O Brasil passaria de 59,0 kg de CO2-eq/kg carne para 335,1 kg de CO2-eq/kg carne!

Há vários problemas graves com o trabalho: Em primeiro lugar, não considera os impactos ao ambiente pela necessidade de aumento de produção de alimentos vegetais e de monogástricos para substituir a carne da dieta. Com essa escolha abre-se mão da produção de proteína de elevada qualidade à partir de capim, com consequente aumento da competição de animais monogástricos por alimentos que servem aos humanos. Esse aumento de competição seria ainda mais exacerbado pois, hoje, boa parte dos nutrientes utilizados pela avicultura são sub-produtos da indústria da carne bovina.

O segundo grave problema é que ele considera que a produção média brasileira por hectare e a área ocupada pela pecuária permaneceria a mesma de hoje até as datas finais projetadas no estudo de 30 e 100 anos. O fato de termos aumentado a produção de 1975 à 2006 em 535% com aumento de apenas 47% de área de pastagem, dá uma ideia de quão errada é essa premissa.

O terceiro grave erro é que, ao fazer as contas de quanto C se acumularia caso as pastagens fossem vedadas, chegaram a valores entre 110-136 t C/ha, ou seja, quase 80% da média do que se encontra na floresta tropical, como a Amazônica (151 t C/ha). Para quem conhece o Cerrado, onde está a maior parte do nosso rebanho, facilmente percebe que esta é também uma grosseira distorção, sendo que valor médio adequado seria 67 t C/ha.

Outra grande falha é justificativa para redução na produção de carne baseada na premissa que a redução do consumo de carne traria a vantagem de uma melhoria da saúde da população.

Chega a ser irônico que os autores, pertencentes à afluente comunidade européia, venham sugerir a redução da produção de carne no mundo, quando exatamente neste momento as populações de países em desenvolvimento começam a ter acesso a ela, ainda em níveis de consumo muito inferiores ao dos países ricos do hemisfério Norte.

Todavia, o maior erro dos autores é, ao fazerem a análise por área, penalizarem nossa pecuária pelo seu maior mérito, que é ser de baixo uso de insumos e, assim, de baixo impacto ambiental. Ainda assim há o mérito desse trabalho ter sido feito baseado em Análises de Ciclo de Vida (ACV), que tenta levar em consideração a totalidade de geração de gases de efeito estufa na cadeia de produção até o consumo (pré-porteira, dentro da fazenda e pós-porteira).

Foi a análise de um desses trabalhos de ACV comparando o impacto ambiental de 1 tonelada de carne produzida no Brasil ou no Reino Unido que primeiro chamou a atenção de como a problemática do AG é, na verdade, uma grande oportunidade para alcançarmos um novo patamar na nossa pecuária.

Nosso pecado em termos de produção de metano é, na verdade, produzi-lo muitas vezes sem a devida contrapartida de produção de carne. Em outras palavras, o problema é o metano produzido em vão por animais sem ganho de peso (ou perdendo peso na seca), bem como aquele emitido por vacas vazias, seja por falha na reconcepção ou pela demora das novilhas entrarem em produção. Produzimos, então, muito metano por quilograma de carne produzida.

O interessante é que, apenas com uma recuperação das áreas degradadas e melhor manejo das pastagens é consenso entre os técnicos que a produção por área no Brasil poderia ser dobrada dos atuais 0,8-1,0 UA/ha. Um bônus adicional da recuperação e manejo de áreas degradadas é que há sequestro de C pelas pastagens no solo, em função do crescimento radicular. Esse é um dos grandes drenos de C que temos para aproveitar.

Portanto, bem ao contrário de reduzir nossa produção, temos que intensificá-la, apenas com o cuidado de fazer de forma mais eficiente do que hoje. Conforme já comentado, ganhos em eficiência tem sido obtido constantemente na nossa pecuária há muito tempo. Nosso envolvimento com o AG apenas faz com que nossa velocidade na adoção de tecnologia deva ser mais rápido, para que passemos de "problema" para "solução".

Nossa eficiência na produção de carne pode ser ampliada enormemente com o uso de sistemas integrados de produção, seja na integração lavoura-pecuária, em sistemas silvipastoris ou na integração lavoura-pecuária-floresta. Outra atividade que pode ser incorporada, em sistemas exclusivos de pastagem ou de integração, é o confinamento que tem-se mostrado a mais eficiente ferramenta em reduzir a emissão de metano por quilograma de carne.

Para quem advoga, como esses infelizes autores europeus, a redução da produção de carne, vale lembrar que as previsões de necessidade de alimento para uma população projetada para 2050 de 9 bilhões são enormes e não podemos abrir de um alimento nobre, produzida por um animal que pode ser criado em áreas impróprias para a agricultura, usando capim ou resíduos diversos, o que evita a competição por alimentos consumidos por humanos. Não devemos perder de vista que, além de grandes pecuaristas, há bovinos que cumprem a função social de ser a "poupança" de muitos pequenos agricultores no mundo e que, na África, 70% da população pobre dependem da pecuária. Também, que nas Análises de Ciclo de Vida, não deveriam ser considerados apenas a carne, mas todos os subprodutos aproveitados do boi, desde o sebo já usado como biocombustível até a farinha de ossos que, apesar de não ter C em sua constituição, reduz a necessidade do produto industrializado, o qual tem embutido maior necessidade de energia para ser produzido e transportado.

Importante, também, o pecuarista saber que a ciência envolvendo essas assunto ainda é recente e está ainda se solidificando, mas que o Brasil está fazendo a sua parte em determinar seus prórpios índices de emissão e fluxos de C, bem como avaliando estratégias de mitigação.

Em síntese, o aquecimento global existe e a pecuária está envolvida, mas no nosso caso o que precisamos é intensificar a produção com ganhos em eficiência. O que os economistas da área mostram é que esse é o mesmo caminho para deixar a propriedade sustentável também do ponto de vista econômico. A rentabilidade da atividade está relacionada com o aumento da intensificação.

Para um mundo cada vez mais demandante de carne, temos todas as condições de provermos a carne mais verde do mundo, com abundância e qualidade. O trabalho de cada produtor de carne bovina no Brasil será muito importante para alcançarmos essa situação e o passado recente faz com que a aposta que chegaremos lá totalmente possível.

FONTE: BeefPoint


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