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13/09/2012
A crise do Euro e seus reflexos no agronegócio brasileiro


A crise da zona do Euro vem se desenhando há cerca de dois anos. As principais fontes propulsoras são o alto endividamento dos países europeus e as incertezas quanto à solidez econômica para a rolagem da dívida. Esse cenário lembra (remotamente) a crise dos países emergentes na década de 1990, em especial asiáticos e latino-americanos. No caso brasileiro, por exemplo, havia déficits públicos nominais crescentes aumentando o estoque da dívida pública que, em parte, estava atrelada à moeda externa. Este ciclo se rompia quando a rolagem da dívida se complicava, com taxas de juros elevadíssimas e com grande diferencial em relação às taxas de outros países, e quando os credores começavam a desconfiar da real capacidade do país em honrar o pagamento da dívida (ou mesmo da rolagem da dívida).

A solução conjuntural para sair da crise foi adotar medidas nada populistas. Do lado fiscal, reduzir os gastos públicos, aumentar a arrecadação de impostos e definir metas de superávit primário. Do lado cambial, a desconfiança gerava saída de capital estrangeiro e forte desvalorização da moeda nacional. Do lado monetário, havia o risco de inflação crescente em função do choque de desvalorização cambial, requerendo políticas monetárias restritivas. Ou seja, o tripé da década de 1990 para os países emergentes saírem da crise estava montado: ajustes fiscal, cambial e monetário para estabilizar a economia.

No caso brasileiro, a desvalorização cambial sofrida em 1999 e a mudança de regime para taxa de câmbio flutuante melhorou a competitividade externa, retomando ao longo do tempo saldos comerciais cada vez mais positivos. No caso da zona do Euro, a única opção para sair da crise (ou amenizá-la) é o ajuste fiscal, já que se trata de uma moeda única para diferentes economias.

Em geral, os níveis de endividamento público em relação ao PIB dos países desenvolvidos são muito maiores do que aqueles dos países em desenvolvimento. Entretanto, a confiança para a rolagem da dívida tende a ser maior, considerando que são países desenvolvidos, que em tese possuem economias sólidas. Os dados atuais da zona do euro indicam que quatro países ultrapassaram o nível de 100% de endividamento em relação ao PIB: Grécia, Itália, Irlanda e Portugal. A média do endividamento alcançou 87,2% do PIB em 2011, ante a 68,6% em 2006.

Apesar da situação atual destas economias, os impactos da crise financeira iniciada nos Estados Unidos na segunda metade de 2008 sobre o PIB da zona do Euro foram ainda mais negativos. Em 2009, a região apresentou queda de 4,4% do PIB, enquanto que o Banco Mundial estima uma redução de 0,3% do PIB em 2012, voltando a crescer nos próximos dois anos. Porém, o ritmo desta retomada do crescimento pode ser mais lenta e gradual a depender das medidas tomadas no velho continente. As projeções realizadas pelos europeus são mais otimistas.

Considerando esta conjuntura não muito animadora, como fica a economia brasileira e, em especial, o agronegócio?

O efeito contágio sobre a economia mundial é inevitável, principalmente para os países dependentes das exportações como é o caso da China. O Banco Mundial projeta um crescimento de 8,2% na China, ou seja, 1 ponto percentual menor este ano em relação a 2011. O governo brasileiro espera mais um ano de crescimento do PIB abaixo de 2% em 2012.

Além disso, é válido esperar que os investimentos estrangeiros diretos também sejam mais restritos para as economias em desenvolvimento. No primeiro semestre de 2012 o Brasil recebeu US$ 2,8 bilhões a menos do que no mesmo período de 2011, uma queda de 8,6%. A mesma tendência negativa se observa em outros países, como a redução de 3,6% destes investimentos na China.

Crises mundiais são normalmente acompanhadas por redução nos preços das commodities. Como um importante exportador de produtos do agronegócio, o Brasil é diretamente afetado. Os preços de exportações dos produtos do agronegócio para a Uniao Europeia reduziram, em média, 5,8% nos primeiros seis meses de 2012, comparados ao mesmo período do ano anterior. Por outro lado, o preço do petróleo continua acima de US$ 100 o barril. Aqui começa o gargalo para vários produtos do agronegócio brasileiro, cuja conjuntura é a combinação de custos crescentes e preços em queda.

Porém, a conjuntura do agronegócio mundial tem variantes adicionais: a seca no sul do Brasil no início de 2012 e a dos Estados Unidos para a próxima safra. No Brasil, a safra de soja deve perder 9 milhões de toneladas, mas a safra de milho deve crescer 12 milhões de toneladas. Nos Estados Unidos, a perda ainda é incerta, mas apenas 23% dos produtores de milho e 27% dos produtores de soja afirmaram ter boas condições para suas lavouras. Como os americanos são os maiores produtores mundiais de grãos (principalmente milho), os preços dispararam. Apesar de terem beneficiários diretos, aumento de preços tem implicações importantes tanto sob a perspectiva de risco de inflação de alimentos quanto dos impactos sobre os setores de proteína animal. A Figura 2 mostra os resultados das safras de 2011 e 2012 de milho e soja.

Produtores de carnes bovina, suína e de frango, leite e ovos sofrem pelo aumento de custos de rações, que compõem até 70% do custo do produto final. Em paralelo, as demandas doméstica e mundial desaquecidas prejudicam o repasse dos custos aos preços.

É importante observar que o índice de preços de fertilizantes está acima do índice de preços agropecuário desde 2008, quando houve um forte descolamento deste insumo mostrando que apenas uma parte da elevação dos custos foram repassados ao produtor. Apesar dos ganhos dos produtores de grãos haverá perdas aos produtores de carnes, leite e ovos, e alguma política mitigadora deste aumento de custos deve ser tomada para evitar ou minimizar uma possível crise nestes setores.

A opção de política econômica do governo atual é voltada para o barateamento do crédito ao consumidor e redução de impostos para setores-chave. Isso significa alavancar o consumo interno no curto prazo e espera-se, como consequência, aumento na produção e nos investimentos. Entretanto, este “modelo de crescimento” está ameaçado pelo nível de endividamento das famílias brasileiras, hoje beirando 60%. Dado este ambiente desfavorável, os investimentos privados não devem decolar, ainda mais sob uma conjuntura nada atraente. No caso do agronegócio, setores de maior valor agregado vêm acumulando perdas e perdendo competitividade, também comprometendo novos investimentos futuros.

Para se ter uma ideia, em média, a taxa de investimento em relação ao PIB está abaixo de 20% desde a década de 1990 e o segundo trimestre de 2012 apresentou uma taxa de 17,9%, redução de quase 1 ponto percentual em relação ao mesmo período de 2011. Se acreditarmos que a taxa de investimento ideal é de 25% do PIB estamos bem longe de chegar perto deste patamar que, aliás, só atingimos uma vez nos últimos cem anos (26,9% em 1989 de acordo com o IBGE).

Assim, pode-se dizer que o cenário atual baseia-se no tripé de demanda desaquecida, risco de inflação de alimentos e crises setoriais. Se os preços dos alimentos continuarem a subir mesmo que não proporcionalmente ao aumento dos custos de produção, o que é de se esperar até 2013, a política de redução dos juros domésticos está comprometida, freando a retomada do crescimento econômico. Mais uma vez, os problemas conjunturais evidenciam os antigos problemas estruturais e a vulnerabilidade da economia brasileira, apesar dos aceitáveis fundamentos macroeconômicos. Continuamos com os mesmos gargalos de infraestrutura de décadas atrás e ainda sofremos com incertezas regulatórias, forte intervenção estatal na economia e uma carga tributária que necessita de revisão. Enquanto não olharmos para os problemas estruturais (o que se baseia em pesados investimentos e na revisão do papel do Estado na economia) e para os “fundamentos microeconômicos” que impulsionam a economia, qualquer pequeno abalo conjuntural expõe nossa competitividade e compromete o crescimento econômico sustentado e de longo prazo.

*Leila Harfuch é Economista, Doutora em Economia Aplicada pela Esalq-USP e pesquisadora sênior do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais – ICONE.

FONTE: BeefPoint


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