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10/09/2013
Para Delfim Netto, incentivo do governo brasileiro à concentração dos frigoríficos é um grave erro


O processo de globalização da economia resultou em uma estrutura perversa no mercado de commodities, em que pouco mais de uma dezena de tradings agrícolas controlam bilhões de produtores rurais. Em escala global, as tradings atuam como um oligopsônio na aquisição de produtos agrícolas, limitando o poder de negociação dos agricultores, e como um oligopólio na venda desses produtos.

Para equilibrar esse processo, o Estado, que de algum modo aceitou e até promoveu a consolidação dessa estrutura, terá de agir e lançar mão de instrumentos de regulação, tais como agências específicas para isso. Essa é a avaliação do economista Antônio Delfim Netto, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP) e ex-ministro da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura.

Em entrevista ao Jornal Valor, Delfim, aos 85 anos, diz que a política de concentração dos frigoríficos brasileiros, capitaneada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), foi um “grave erro”, e é parte desse processo global da oligopolização da produção global de alimentos. Mesmo quando há grandes economias de escala, estruturas oligopsônicas e oligopolísticas são contra o aumento da produtividade, afirma.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Jornal Valor: O Brasil foi beneficiado na última década pela explosão da demanda chinesa. Esse ciclo acabou?

Antônio Delfim: A demanda por produtos agrícolas depende, no fundo, do crescimento da população e da urbanização. Mas eu não vejo que você vai ter uma redução muito importante da taxa de crescimento da demanda de produtos agrícolas nos próximos anos. O que vai mudar, seguramente, é a estrutura da demanda. Você vai caminhar mais para produtos proteicos, porque o mundo está melhorando seu nível de renda. Mas não vejo nenhuma razão para imaginar uma debacle nos preços agrícolas. Teremos, no fundo, uma relativa estabilização. Os preços, provavelmente, vão voltar a declinar lentamente como sempre acontece, o que não significa que a demanda global vai diminuir.

Jornal Valor: Mas o maior salto já foi?

Antônio Delfim: O principal salto foi o avanço espetacular da China, que não vai se repetir. Mas imaginar que a China vai reduzir a sua demanda dramaticamente é um erro. Ela vai continuar crescendo 4,5%, 5% ao ano. E mais importante: vai aumentar muito a urbanização, o que reduz a oferta de produtos agrícolas de um lado e aumenta a demanda de outro, porque aumenta a renda.

Jornal Valor: O sr. acha que o Brasil aproveitou bem o boom da China?

Antônio Delfim: O Brasil não aproveitou bem o boom das commodities. Durante dez anos, tivemos um crescimento das relações de trocas importante, o que significa que a renda crescia mais do que o PIB. Teria sido o momento para fazer as mudanças estruturais que nós precisamos. Mas optamos por um caminho um pouco diferente. Usamos muito mais desses recursos na redistribuição de renda do que no aumento da eficiência produtiva, o que é compensado por um aumento do bem-estar visível. Mas um dos aspectos mais difíceis de entender é que você sacrificou uma parte das vantagens da melhoria das relações de troca para valorizar o câmbio e para combater inflação – ou seja, você jogou fora uma parte desses recursos.

Jornal Valor: De algum modo, o Brasil é refém da “maldição” dos recursos naturais, se é que ela existe?

Antônio Delfim: Não tem maldição nenhuma. O Brasil aproveitou esses recursos e desenvolveu um setor agrícola extremamente eficiente. A agroindústria, que talvez seja um quarto do PIB, é um setor altamente eficiente. É um setor sofisticadíssimo, mas muito prejudicado por falta de estrutura, de transportes, de portos, por falta de armazenagem e por falta de uma política importante, que é a política de seguro de safra.

Jornal Valor: O Estado brasileiro incentivou uma concentração entre frigoríficos? O sr. concorda com isso?

Antônio Delfim:  Isso é um grave erro, porque cria organismos que são um oligopsônio na hora de comprar e oligopólios na hora de vender. Você não pode ter milhões de produtores e dois sujeitos comprando tudo o que eles produzem. Aliás, essa é uma tragédia que está acontecendo no mundo. O número de empresas que transacionam commodities se reduziu dramaticamente. O monopólio é muito ruim. Estruturas oligopsônicas e oligopolíticas são contra o aumento da produtividade, mesmo quando se diz que há grandes economias de escala. A estrutura em que você reduz a quantidade de oferta ou reduz a quantidade de compradores é uma estrutura perversa.

Jornal Valor: Mas uma das alegações, no caso dos frigoríficos, é que a concentração ajudaria a melhorar a sanidade da cadeia produtiva.

Antônio Delfim:  A política sanitária é coisa do governo. Você não precisa de gente grande para comprar gado bom. Você pode ter gente pequena comprando gado da melhor qualidade do ponto de vista da sanidade.

Jornal Valor: E o que fazer para combater esse processo de concentração?

Antônio Delfim: O Estado não pode deixar que se formem monopólios. Quando existir um monopólio, ele tem que ter uma agência reguladora independente e que ele não possa se apropriar dela.

Jornal Valor: No caso do Brasil, o Estado escolheu os vencedores?

Antônio Delfim: Isso não importa. A política em si é que está equivocada. Não é que se escolheu A ou B. Pode até ter escolhido pessoas ou empresas que vão progredir. Mas o que está errado é a política.

 

Fonte: Beefpoint


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